segunda-feira, 30 de junho de 2008

Garoto é condenado por andar na contramão:

Ainda longe de tudo, preferia manter-se assim: afastado do plano concreto do real. Absteve-se de pensamentos que se prendiam à matéria e pensava somente no que via. Sentado na varanda, de costas para a casa e de frente para o jardim que tinha o dobro do tamanho, via os pássaros descerem das árvores, como folhas secas que caem sem ter escolha, para comer a ração jogada ao chão. Em uma paz intermitente, voavam de volta aos galhos a qualquer sinal de perigo, fosse barulho, fosse algum predador.
Violão em mãos, o garoto dedilhava notas que mais tarde seriam, juntas, uma canção para a mulher amada - que era uma das coisas que pensava. Coisa curiosa essa de apaixonar-se e, como ele, de mudar de paixão como quem muda de rumo numa caminhada - e perder-se, sempre, completamente, por inteiro, fosse por um sonho, fosse por uma desilusão, lá estava ele, seguindo o rumo de sua vida motivado por uma mulher. E não qualquer uma: sempre era aquele tipo de mulher que não poderia ser de ninguém, que nunca seria de ninguém. Amar o inatingível, não como um desafio, mas como uma idolatria, como uma eterna perplexidade, um admirável arregalar de olhos e um sorriso involuntário ao analisar a situação.
E para ele não era nada demais. Era um rumo que se tem de seguir e que, involuntaria e inquestionavelmente seguimos sem nos dar conta. Adaptamo-nos e conformamo-nos na mesma qualidade: involuntaria e inquestionavelmente.
E seguimos, eternamente...