Me lembro da primeira vez que me encontrei de fato com o mar. De longe o ribombo ressoando, indo e voltando com a maré. Passo por passo, calcados obstinadamente, parei a sua frente. A primeira onda me alcançou, vindo como uma mensageira me receber, fazendo meus pés submergirem na areia. Assim que voltou de onde veio, já pensando em voltar, levou de mim a única inocência que me restara: a de crer na perenidade das coisas.
Talvez seja esse o motivo da ligação quase religiosa que tenho com o mar. Essa busca incessante pelo eterno, pela segurança, essa constante fuga do medo e da Morte. Essa descrença no infinito, ainda que não me falte vontade de acreditar.
Em outra ocasião me lembro dos pescadores, de suas feições passivas de felicidade, de aceitação. Olhos crispados em fé, já sem lágrimas. As redes contrastando com as almas que nublavam as tardes. Seus longos silêncios, interrompidos vez ou outra pelo choque entre madeiras, e então iam. Rompiam a água como uma enorme quilha do próprio mar, passavam a pequena ilha onde havia uma pequena igreja branca de batentes azuis e um túmulo, a memória cercada de pedras em direção ao céu, e sumiam. Voltaram, quem sabe. Nunca os vi voltar.
Engraçada essa coisa do mar de dar e tirar, entregar e levar. De repente me lembrei de todas as conchas que perdi para a corrente, dando sem querer de volta ao mar o que peguei sem permissão.
De repente me lembro que o mar está longe, que a Mulher está longe, que os Amigos e Amigas estão longe e que tem chovido incessantemente durante horas como se todas as divindades resolvessem enfurecer-se pela minha incapacidade de ser sozinho. A verdade é que não sei ser absolutamente nada sem essas coisas.
sexta-feira, 16 de janeiro de 2009
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